In Artigos, Clipping

Não faz muito tempo a sociedade brasileira – aí incluída de forma fundamental os próprios meios de comunicação – passou a despertar atenção e interesse pelos chamados recall da indústria automobilística.

Como profissional envolvido na questão da violência do trânsito, acompanhei o processo com muita atenção e estou convencido que esse ”fenômeno social” foi consequência de três momentos especiais.

O primeiro deles o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078 de setembro de 1990, que estabeleceu normas de proteção e defesa do consumidor, regulando a relação FORNECEDOR X CONSUMIDOR até então promíscua e desigual.

O segundo, a edição do livro RECALL – 4 MILHÕES DE CARROS COM DEFEITO DE FABRICAÇÃO, um excepcional trabalho investigativo do jornalista Rodolfo Rizzotto que entre outras coisas, teve a capacidade de revelar que a relação entre montadora e proprietários de veículos é, mais do que uma simples questão de consumo, uma questão de segurança pública e de preservação da vida.

E, finalmente, o trabalho parlamentar do Deputado Federal pelo estado do Rio de Janeiro, Hugo Leal, advogado por formação e também um especialista em trânsito, que ao longo de seu mandato promoveu diversas audiências publicas e outras iniciativas legislativas com o objetivo de harmonizar e integrar as ações dispersas do estado (DENATRAN, do Ministério das Cidades e DPDC, do Ministério da Justiça, entre outros) e responsabilizar diretamente as montadoras, através de sua entidade representativa ANFAVEA.

Ao longo desse curto período, os proprietários de veículos automotores brasileiros evoluíram da ignorância absoluta para uma consciência relativamente clara dos riscos que envolvem um defeito de peça ou de projeto (classificado tecnicamente por ”não conformidade”) estimulados até pela nova e elogiável maneira de conduzir a questão pela própria indústria automobilística.

Evoluímos sim. Mas ainda estamos muito longe da perfeição e ainda bastante distante do que acontece nos paises mais desenvolvidos, exatamente onde estão instaladas as matrizes das montadoras aqui estabelecidas.

Um ”vício” recorrente é o conteúdo dos textos dos chamamentos divulgados.

Qualquer profissional de comunicação, notadamente aqueles dedicados à publicidade e propaganda, sabe que a clareza da mensagem é que vai convencer o leitor/consumidor a decidir por um ou outro produto ou serviço. A persuasão, a objetividade e a perfeita compreensão do que se lê faz toda a diferença e, no caso dos recalls, mais ainda porque – como dito acima – a questão transcende a relação de consumo e envolve a integridade física de pessoas.

O mais recente caso desse vício pode ser de constatado nos jornais do dia 26 de janeiro de 2011, com o recall da Peugeot para o modelo HOGGAR em todas as versões.

O texto do chamamento diz que o problema é no suporte do alternador e que as razões são ”uma possível não conformidade da bomba de direção hidráulica. “Ao longo do tempo, poderá haver endurecimento da direção e, em casos raros, poderá ocorrer vazamento do fluido de direção hidráulica, podendo causar princípio de combustão no compartimento do motor.”

O texto prossegue informando que os riscos são ”má aplicação do torque de fixação dos parafusos do suporte do alternador na bomba de direção hidráulica o que pode gerar desalinhamento na polia de direção hidráulica e conseqüente desprendimento ou rompimento da correia de acessórios. Pode também ocorrer a fissura no suporte do alternador, ocasionando a perda de assistência da direção e conseqüente risco de acidente”.

Entenderam? Nem eu… E tenham a certeza de que me esforcei!

Fui então buscar a opinião de um perito e fiz um desafio: Há como traduzir esse chamamento de forma menos ”tecnicista” em um texto mais curto, grosso e direto? A resposta de Rodrigo Kleinubing, Engenheiro Mecânico e Perito Criminalístico do estado do Rio Grande do Sul foi quase imediata:

”Defeito de fabricação da bomba do sistema da direção hidráulica com risco de acidente por perda do controle da direção do veículo: de forma repentina o sistema de direção perde o recurso hidráulico, resultando no endurecimento do volante o que, numa curva fechada, por exemplo, pode causar acidente grave por perda de dirigibilidade. Risco de incêndio pelo vazamento do fluído hidráulico em contato com partes quentes do veículo (motor, coletor de descarga e outros).”

Como pedi, a sugestão de Rodrigo foi curta, grossa, direta e certamente mais eficiente, sob o ponto de vista da comunicação e mais barata, sob o aspecto do espaço publicitário pago pela montadora aos jornais.

*Fernando Pedrosa é especialista em Prevenção e Segurança no Trânsito – Membro Titular da Câmara Temática de Educação para o Trânsito e Cidadania do CONTRAN.

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