Jornal do Commercio – PE – 27/09/2010- Editorial
A Semana Nacional do Trânsito, que acaba de ser comemorada, não nos permite acreditar na existência de nada parecido com uma política nacional de trânsito, o que torna inócua a data. A sequência de acidentes gravíssimos nas estradas brasileiras nos últimos dias só fez realçar ainda mais a impropriedade de se imaginar qualquer tipo de comemoração nessa matéria, mesmo com todo esforço despendido pelas autoridades do setor. Na verdade – abstraída a questão de culpa, mas destacada a necessidade de se ter uma política radicalmente transformadora -, a soma do que temos hoje apenas nos dá a convicção de que realmente o Brasil é detentor do indesejável troféu de um dos piores trânsitos do mundo e caminha para piorar ainda mais, se não forem adotadas providências severas e urgentes.
A primeira e mais assustadora constatação que se pode fazer na Semana Nacional do Trânsito de 2010 é que o problema vem sendo agravado proporcionalmente à melhoria da economia. Significa dizer: o País produz mais carros, há mais brasileiros comprando, cresce aceleradamente o número de veículos, e as cidades e rodovias não acompanharam, nem acompanham, essas mudanças. Focar a campanha da semana de trânsito na obrigatoriedade do uso da cadeirinha e do cinto de segurança não é bastante para se vislumbrar avanços.
Pelo contrário, o certo hoje é se acentuar as deformações para delas tirar saídas, com urgência. Fundamental é ter respostas para questões como o combate ao motorista alcoolizado e a necessidade de se implantar a intolerância ao excesso de velocidade. Da mesma forma, cobrar-se dos poderes públicos respostas para os estragos nas rodovias e a impossibilidade de se ter o crescimento vertiginoso da frota de veículos, quando as cidades não oferecem mais espaços, gerando-se uma paranoia nacional em grau crescente diário.
O pressuposto de tudo em relação ao trânsito – como em quase tudo mais na vida nacional – é a educação e talvez por isso cuidem, os responsáveis pelo setor, de dar à Semana Nacional do Trânsito uma conotação didática, o que é louvável mas – insistimos – insuficiente para a gravidade do problema. Vejamos, por exemplo, a questão da chamada LEI SECA, que teoricamente representaria um marco em matéria de segurança nas estradas e chegou a registrar índices animadores. Alguns dos acidentes mais graves dos últimos dias tiveram origem no álcool, conforme foi visto nas cenas gravadas pelas televisões. De outro lado, seguidamente se vê a arrogância de motoristas que se recusam a fazer o teste do bafômetro, com o suporte do ordenamento jurídico. Assim, temos a combinação do desrespeito com o descrédito, levando a lei a se aproximar de outras normas sem qualquer efetividade.
De outro lado, temos o hábito do desrespeito à sinalização nas estradas como outro componente sempre associado aos acidentes. Não é preciso procurar muito longe para verificar como as normas de trânsito têm pouca aplicação em nossas rodovias, exceto nas proximidades do controle eletrônico de velocidade. Qualquer observador pode constatar a todo instante carros que excedem, em muito, os limites de velocidade até que chegam nas proximidades da sinalização de controle eletrônico. A ultrapassagem em locais proibidos é, igualmente, uma prática corrente e insistentemente associada aos grandes acidentes. Como, então, poderemos um dia descer do pódio dos piores trânsitos do mundo tolerando infrações dessa natureza?
Da resposta a essa pergunta dependem as estatísticas de acidentes, que significam maior, ou menor, segurança no trânsito. Significam mais, ou menos mortes, mais, ou menos, acidentados. E, consequentemente, mais, ou menos, luto e um custo social altíssimo com a ocupação de leitos hospitalares em decorrência da ignorância das regras básicas de trânsito, da imprudência ou da irresponsabilidade criminosa.